Aposentados denunciam débitos automáticos não autorizados; duas empresas acumulam mais de 15 mil processos cada

Aposentados de diferentes estados do Brasil estão descobrindo débitos automáticos não autorizados em suas contas bancárias. Diferente da recente fraude no Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), esses descontos não ocorrem na folha de pagamento, mas diretamente nas contas bancárias após o depósito dos benefícios. Os nomes que aparecem nos extratos são das empresas Paulista Serviços (Pserv) e do Grupo Aspecir, que negam irregularidades e afirmam que os débitos são autorizados pelos clientes, mediante documentos ou gravações. No entanto, muitos consumidores alegam nunca terem contratado qualquer serviço e sequer conhecem as empresas.

O caso do aposentado Armando Quintanilha Boechat ilustra a situação. Desde julho de 2023, ele percebeu descontos mensais que, somados, ultrapassaram R$ 1 mil. Ao procurar o INSS, confirmou que não se tratava de desconto previdenciário, mas de débito em conta. Somente após contato com a Pserv, descobriu que o débito estava vinculado a uma empresa chamada SP Gestão de Negócios em Telemedicina, da qual também afirma nunca ter sido cliente.

Levantamento do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) mostra que a Pserv enfrenta mais de 15 mil processos na Justiça de 1º grau e nos Juizados Especiais. Já o Grupo Aspecir acumula cerca de 20.777 ações, sendo 14.042 apenas contra a Aspecir Previdência. As duas estão entre as 200 empresas com mais processos ativos no país.

Em nota, a Pserv afirmou que apenas presta serviços de cobrança e processamento de pagamentos para outras empresas, não comercializando diretamente produtos ou serviços. Já o Grupo Aspecir declarou que todas as autorizações são formalizadas por documentos assinados ou gravações telefônicas, seguindo as normas do Banco Central e da Superintendência de Seguros Privados.

O Ministério Público de São Paulo instaurou inquérito civil para investigar a atuação da Pserv. A investigação questiona a identificação das empresas nos extratos, já que, muitas vezes, o nome que aparece não corresponde ao real fornecedor do serviço. No caso de uma consumidora, o débito identificado em nome da Pserv estava vinculado a outras empresas, como ZS Seguros e Telefoco Barra Consultoria.

O banco Itaú informou que cumpre os protocolos do Banco Central para débitos autorizados e que notifica seus clientes sobre lançamentos na conta. Já a ZS declarou que atua apenas como intermediária tecnológica no processamento de pagamentos.

Há relatos de consumidores que, ao exigirem provas das supostas contratações, não receberam qualquer gravação ou contrato assinado, embora, em alguns casos, os valores descontados tenham sido devolvidos. Sentenças judiciais reforçam a fragilidade das defesas das empresas. Em uma decisão no Maranhão, o juiz destacou que os documentos apresentados não continham assinatura do contratante. Outro caso, no Rio Grande do Norte, apontou ausência de contrato formal, o que levou à condenação das empresas ao ressarcimento dos valores, além de indenização por danos morais.

Um caso específico envolvendo a aposentada Ana Lúcia da Silva revelou ainda mais inconsistências. A proposta apresentada pela Pserv para justificar os débitos estava preenchida com dados de outra pessoa, uma homônima, nove anos mais jovem, com diferentes filiação, CPF e endereço. A Clube Blue, empresa que aparecia como beneficiária, alegou que suas vendas são auditadas e que possui gravações de 100% das adesões, embora não tenha apresentado tal prova no processo.

Diante dos fatos, consumidores e especialistas recomendam que aposentados acompanhem atentamente seus extratos bancários e busquem imediatamente seus direitos caso identifiquem qualquer cobrança não autorizada. As investigações continuam, e o Ministério Público busca esclarecer a licitude dessas operações e a responsabilidade das empresas envolvidas.

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