A recente vitória de Donald Trump nas eleições presidenciais dos Estados Unidos gerou um cenário de incertezas para a comunidade internacional, especialmente no que diz respeito ao papel dos EUA em questões globais e à sua postura em fóruns multilaterais como o G20. Especialistas alertam para possíveis mudanças significativas na abordagem americana sobre temas como mudanças climáticas, a guerra na Ucrânia e a política comercial internacional, o que pode afetar diretamente as discussões e os acordos no bloco das maiores economias do mundo.
Durante sua campanha, Trump sinalizou uma postura mais nacionalista, com ênfase na política “América Primeiro”, o que, segundo analistas, poderá reduzir o engajamento dos Estados Unidos em temas globais tratados no G20. Para o professor Leandro Consentino, especialista em Relações Internacionais do Insper, a eleição de Trump tem o potencial de impactar diretamente a dinâmica do G20, considerando o poder econômico e militar dos EUA.
“Os Estados Unidos, como o país mais poderoso do mundo, influenciam significativamente os debates do G20. A gestão Trump pode mudar a forma como o país se posiciona em relação a esses debates, dominando boa parte das discussões, principalmente sobre questões de futuro e segurança global”, afirma Consentino.
Impactos no clima e na guerra da Ucrânia
Um dos maiores temores é a mudança na política climática dos Estados Unidos. Durante seu primeiro mandato, Trump retirou o país do Acordo de Paris, e especialistas temem que o republicano repita essa ação no segundo governo, uma vez que ele já indicou, durante a campanha, que considera o acordo prejudicial à economia americana. Para o professor Lucas de Souza Martins, da Temple University, a postura de Trump sobre questões climáticas pode enfraquecer os esforços globais em reduzir as emissões de carbono e limitar o aquecimento global.
Além disso, a postura de Trump em relação à guerra da Ucrânia também é motivo de preocupação. Durante a campanha, Trump sugeriu que os EUA poderiam reduzir ou até mesmo retirar seu apoio à Ucrânia, o que afetaria diretamente a dinâmica da guerra e as relações no G20, já que o apoio americano tem sido crucial para a resistência ucraniana contra a invasão russa. “Sob o governo Trump, é possível que a guerra na Ucrânia receba menos ou nenhum apoio dos EUA, o que mudaria completamente o equilíbrio geopolítico”, destaca Consentino.
Menos multilateralismo e mais unilateralismo
Outro ponto destacado pelos especialistas é a tendência de Trump de priorizar os interesses nacionais dos EUA em detrimento do multilateralismo. Para Lucas de Souza Martins, a administração Trump não estará disposta a investir em fóruns multilaterais como o G20, uma vez que o foco de sua política externa estará em questões bilaterais e no fortalecimento da economia americana, muitas vezes à custa de acordos globais.
“O G20 é um fórum onde países se reúnem para discutir soluções para questões globais, mas o ‘trumpismo’ é baseado em um nacionalismo que desvaloriza esse tipo de colaboração internacional. O foco será colocar os interesses dos Estados Unidos em primeiro lugar, e não em encontrar soluções coletivas”, afirma Martins.
Impactos na Cúpula do G20 no Brasil
A Cúpula do G20, marcada para os dias 18 e 19 de novembro no Rio de Janeiro, ocorrerá em meio a esse cenário de transição nos Estados Unidos. Joe Biden, presidente em exercício dos EUA, participará do encontro, mas os especialistas alertam que as discussões e acordos resultantes do evento podem ser temporários e não totalmente implementados caso Trump volte à Casa Branca em janeiro de 2025.
Leandro Consentino considera que a eleição de Trump pode afetar a eficácia das negociações no G20. “Os líderes mundiais terão que equilibrar suas expectativas, pois muitos dos acordos assinados durante o governo Biden podem ser revogados ou alterados por Trump. Isso cria uma incerteza sobre a continuidade dos compromissos globais”, pondera.
Já Lucas de Souza Martins acredita que, embora a programação da cúpula não seja diretamente afetada pela eleição de Trump, há um risco de que qualquer acordo assinado com os EUA sob a administração Biden seja descumprido pelo novo governo republicano. “O que for acordado no G20 pode não ser cumprido pela administração Trump. Nos Estados Unidos, a política externa agora é extremamente polarizada, e as mudanças de governo resultam em mudanças abruptas na direção da política internacional”, afirma Martins.
Conclusão: uma nova era para o G20?
A eleição de Donald Trump marca uma mudança importante na política externa dos Estados Unidos e levanta questões sobre o futuro do G20 e da diplomacia multilateral. A postura mais isolacionista e nacionalista do republicano pode resultar em menor engajamento do país nas discussões globais e em mudanças na maneira como os EUA se posicionam em relação a temas cruciais, como o clima e a guerra na Ucrânia. O impacto dessas mudanças será sentido nas próximas reuniões do G20, incluindo a cúpula de 2024, onde as expectativas são de que os debates sejam mais desafiadores e com maior incerteza sobre os compromissos assumidos pelos Estados Unidos.