Nos últimos dias, o debate sobre uma possível recessão nos Estados Unidos ganhou força, com quedas no mercado de ações e indicadores apontando para um esfriamento da maior economia do mundo. Esse cenário ocorre em meio às políticas do presidente Donald Trump, que incluem novas tarifas comerciais para países como China, Canadá e México, além do corte de empregos públicos para reduzir os gastos do governo.
A incerteza econômica aumentou após uma entrevista de Trump à Fox News, onde ele não descartou a possibilidade de recessão e mencionou um “período de transição”. Embora muitos economistas afirmem que ainda não há sinais concretos de recessão — definida como dois trimestres consecutivos de queda no PIB —, a incerteza pode afetar investimentos e a economia global. Tarifas mais altas sobre produtos importados pressionam a inflação e podem impactar cadeias de suprimentos internacionais.
O peso da economia americana significa que uma recessão nos EUA teria impacto mundial, inclusive no Brasil. Segundo Gustavo Rostelato, economista da gestora Armor Capital, uma recessão limitaria o fluxo global de negócios e poderia levar os bancos centrais a flexibilizar a política monetária com cortes de juros.
A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) reduziu suas projeções de crescimento global devido às novas políticas americanas. Para 2024, a estimativa passou de 3,3% para 3,1%, enquanto a previsão para 2026 caiu de 3,3% para 3%. No Brasil, o crescimento esperado foi reduzido de 2,3% para 2,1% este ano e de 1,9% para 1,4% no ano seguinte. O México e o Canadá também sofreram revisões negativas devido ao impacto das tarifas comerciais impostas pelos EUA.
O Brasil pode ser afetado de diversas formas. Uma recessão nos EUA reduziria as exportações brasileiras, especialmente de produtos manufaturados, já que os Estados Unidos são o segundo maior destino das exportações brasileiras, atrás apenas da China. Em 2023, as exportações brasileiras para os EUA atingiram um recorde de US$ 40,3 bilhões, segundo a Amcham Brasil. O mercado financeiro também sentiria os efeitos, com quedas na Bolsa e alta do dólar, como já observado recentemente.
Rostelato explica que, além das exportações, a atividade econômica brasileira poderia ser impactada pela queda nos preços das commodities e pelo aumento da inflação importada. Um exemplo prático é o aumento no preço do ovo no Brasil, que subiu 15% em fevereiro de 2024, impulsionado pelo aumento das exportações para os EUA, onde a gripe aviária afetou a produção local.
Empresas brasileiras com operações nos Estados Unidos, como Embraer e Gerdau, também podem ser prejudicadas. Além disso, caso a China — maior parceiro comercial do Brasil e alvo das novas tarifas americanas — seja impactada, o Brasil enfrentará desafios adicionais.
Historicamente, o temor de recessão nos EUA já surgiu outras vezes sem se concretizar. A última recessão ocorreu em 2020, devido à pandemia de COVID-19, mas foi breve devido às medidas de alívio econômico adotadas pelo governo. No entanto, analistas apontam que o momento atual é diferente, pois as incertezas vêm da política comercial e fiscal, e não apenas do consumo.
Gustavo Cruz, estrategista da RB Investimentos, destaca que, se antes o temor de recessão estava ligado à alta inflação, agora a preocupação é com os custos para as empresas e potenciais demissões. Isso pode resultar em um impacto global significativo, com reflexos diretos na economia brasileira.